segunda-feira, 2 de maio de 2011

As Palavras Esquecidas


   
   Esta obscuridade chegou a tal ponto que os homens não mais compreendem as noções mais simples, expressas no Evangelho com as mais simples palavras. Hoje, tendo a luz da doutrina de Cristo penetrado até os ângulos recônditos da consciência humana, conforme disse Ele, grita-se de cima dos telhados o que ele dizia ao pé do ouvido; quando esta doutrina se mescla a todas as manifestações da vida doméstica, econômica, social, política e internacional, seria inexplicável que permanecesse incompreendida se para tanto não houvesse causas especiais.

   Uma destas causas é que tanto fiéis como ateus estão firmemente convencidos de que compreenderam, há muito tempo, tão completa, positiva e definitivamente a doutrina evangélica, que não é possível atribuir-lhe um significado diverso daquele que lhe é dado. E sua interpretação errônea é fortalecida pela antiguidade da tradição. O rio mais copioso não pode acrescentar uma gota d'água a um copo já cheio.

   Pode-se explicar ao homem mais ignorante as coisas mais abstratas, se ele delas ainda não tem noção alguma; mas não se pode explicar a coisa mais simples ao homem mais inteligente, se ele está firmemente convencido de saber muito bem o que se lhe quer ensinar.

   A doutrina de Cristo apresenta-se aos homens de nosso tempo como uma doutrina perfeitamente conhecida desde há muito em seus mínimos detalhes, e que não pode ser compreendida de modo diverso do que o é atualmente. O cristianismo é, assim, para os fiéis, uma revelação sobrenatural, milagrosa, de tudo o que é dito no Credo. Para os livres-pensadores é uma manifestação esgotada do desejo que têm os homens de crer no sobrenatural, um fenômeno histórico que encontrou sua expressão definitiva no catolicismo, na ortodoxia, no protestantismo, e que para nós não mais possui qualquer significado prático. 

   A importância da doutrina é ocultada dos fiéis da igreja e dos livres-pensadores da ciência. Comecemos a falar dos primeiros. Há 1.800 anos, em meio ao mundo romano, surge uma nova doutrina, estranha, nada semelhante a nenhuma das que a haviam precedido e atribuída a um homem, Cristo. Esta doutrina era inteiramente nova (tanto na forma, quanto na substância) para o mundo judaico que a tinha visto nascer e sobretudo para o mundo romano, onde era pregada e propagada.

   Em meio às complicadíssimas regras religiosas do mundo judaico — onde, segundo Isaías, havia regra sobre regra — e à legislação romana, levada a um alto grau de perfeição, surge uma nova doutrina que negava não apenas todas as divindades, como também todas as instituições humanas e suas necessidades. Em troca de todas as regras das antigas crenças, esta doutrina não oferecia senão um modelo de perfeição interna, de verdade e de amor na pessoa do Cristo e, como conseqüência desta perfeição interna, a perfeição externa, preconizada pelos profetas: o reino de Deus, no qual todos os homens, não mais sabendo odiar, serão unidos pelo amor, e no qual o leão estará frente ao cordeiro. Ao invés de ameaças de castigo para as infrações das regras ditadas por antigas leis religiosas ou civis, ao invés da atração das recompensas por sua observância, esta doutrina só atraía por ser a verdade.

“Se alguém quiser cumprir Sua vontade, saberá se minha doutrina é de Deus ou se falo de mim mesmo" (Jo 7,17). "Vós, porém, procurais matar-me, a mim que vos falei a verdade" (Jo 8,40),  "e a verdade vos fará livres. Não devemos obedecer a Deus senão com a verdade. Toda a doutrina será revelada e compreendida pelo espírito da verdade. Façam o que Deus lhes manda e conhecerão a verdade" (Jo 8,36).

   Nenhuma outra prova da doutrina foi apresentada além da verdade, a adequação da doutrina com a verdade. Toda a doutrina consistia na busca da verdade e em sua observação, na efetivação cada vez mais perfeita da verdade e do desejo de dela se aproximar, sempre mais, na vida prática. Segundo esta doutrina, não é por meio de práticas que o homem se torna justo.

   Os corações elevam-se à perfeição interna através de Cristo, modelo de verdade, e a perfeição externa pela efetivação do reino de Deus. O cumprimento da doutrina está no caminho da estrada indicada, na busca da perfeição interna pela imitação de Cristo, e da perfeição externa graças ao estabelecimento do reino de Deus. 

   A maior ou menor felicidade do homem depende, segundo esta doutrina, não do grau de perfeição que ele pode alcançar, mas do seu caminho mais ou menos rápido para esta perfeição.

Liev Tolstói em, O Reino de Deus está em Vós.

5 comentários:

  1. Isso é algo compreensível tendo em vista que quando a igreja católica começou a ganhar seguidores, muito tempo depois da morte dos apóstolos e de Jesus, os textos "sagrados" eram todos escritos a mão, e ao longo da história as bíblias usadas pelos pregadores nas igrejas foram escritas sempre a mão de geração em geração, mas para entender isso é necessário ter um breve histórico da Igreja Católica e da Biblia.

    Historicamente, a morte de Jesus Cristo data do dia 3 de abril do ano de 33 d.C (depois de cristo, obviamente). Após isso, os seguidores de cristo foram perseguidos pelo império romano que proibia o cristianismo até aproximadamente o ano de 313 d.C (século IV), quando foi declarado o Edito de Milão, que dizia que o império romano seria neutro em relação ao credo religioso (280 anos após a morte de Jesus e da maioria dos apóstolos).

    Ainda no século IV a religião católica foi declarada como oficial de roma no templo de Teodósio, após isto o imperados convocou uma assembléia com os lideres da igreja católica para decidir as divisões de terra para igreja.
    Período onde a igreja começou a formulação de seus livros "sagrados" a partir dos documentos que dispunha.
    No ano de 325 d.C, uma grande reunião de lideres da igreja católica chamada de o Consílio de Nicéia decidiu criar o símbolo da trindade (Pai, filho e espirito-santo ) em respostas a heresias (atos não católicos) que eram praticadas pelos arianos em relação aos macedonios (que eram católicos), tendo sido necessário então a modificação dos textos sagrados.
    Logo após, para resolver os debates que ocorriam referentes a se Jesus era um homem ou era Deus foi definido, pelo concílio de Éfeso, que seria atribuído a Jesus qualidade Divina de Filho de Deus e a Maria receberia a qualidade Divina de Aquela que portou Deus, sendo mais uma vez necessária a alteração dos textos sagrados.
    Procedimentos semelhantes repetiram-se inúmeras vezes ao longo da história da igreja

    As biblias eram escritas em latim, idioma que o povo não sabia falar, somente o clero, facilitando assim que a igreja pudesse pregar o que lhe fosse mais conveniente.
    As primeira Bíblias impressas foram feitas por Gutenberg em 1450 e ficaram prontas em 1455, portanto em todos esses 1137 anos de história, somente o alto clero tinha acesso aos textos sagrados, tendo escrito, modificado e incorporado a ela somente os textos que seriam mais vantajosos para seus interesses.
    A primeira versão impressa da bíblia feita por Gutenberg foi em 1450 foi baseada na versão usada na época pela igreja, editada ao longo de mais de um milênio de história da forma que a igreja queria.

    A primeira tradução da bíblia para outros idiomas que não fosse sua língua original (Latim) foi feita por Martinho Lutero durante seu exílio, impressa em 1522, baseado na bíblia que era usada pelo clero na época, que era a versão impressa por gutenberg 67 anos antes.
    Lutero incorporou a suas traduções todas os seus pontos de vistas em relação a erros da doutrina católica, pontos de vista que ele já tinha publicado em textos anteriores que ele havia publicado, e que o fizeram ser exilados pelo papa.

    Como fica claro, os textos que se tem hoje em dia como base para a doutrina cristã, para a doutrina de jesus e sobre deus, que é a biblia, não dão ao leitor nenhuma segurança sobre suas informações, sendo que foram consideravelmente alteradas em relação de suas fontes primárias. Sem considerar que, suas próprias fontes primordiais (primeiros escritos aramaicos) foram também escritas por homens, em épocas posteriores a dos acontecimentos relatados nas escrituras.

    Fica portanto, difícil dizer com certeza "O que deus nos manda".

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  2. "Façam o que Deus lhes manda e conhecerão a verdade"
    O mais difícil é saber com certeza o que foi que Deus nos Disse.
    Afinal DEUS nunca veio escrever nada com as próprias mãos, tudo que se tem escrito sobre ele foi escrito por homens, muito tempo depois que os supostos eventos teriam acontecido. Sendo que essas pessoas que escreveram os textos nem chegaram a conhecer os profetas protagonistas das histórias, que diziam ter o "Dom" de conversar com deus e ouviram do próprio Deus suas "leis". Hoje em dia com o conhecimento Psicológico das doenças mentais, sabe-se que Esquizofrenia (ouvir ou ver coisas que não existem), alucinações e neuroses são doenças comuns desde antigamente.

    O mesmo ocorre com os textos que falam sobre Jesus Cristo. Ele próprio nunca escreveu nada.
    A Maior parte dos evangelhos consistem dos apóstolos contando a história de Jesus sobre seu próprio ponto de vista, no entando, nem foram os próprios apóstolos que escreveram.
    Os primeiros textos comprovadamente Bíblicos encontrados por arqueólogos foram escritos em datas posteriores as mortes dos apóstolos, o que comprova que quem escreveu os textos foram pessoas que ouviram as histórias dos apóstolos que foram passadas de boca em boca ao longo do tempo. Pode-se imagina o quanto a informação não deve ter sido alterada ao longo desse tempo.

    Uma prova disso é o fato de que alguns destes textos, que se referem aos evangelhos de alguns apóstolos (que coincidentemente não entraram no novo testamento) apresentam informações contraditórias as que são normalmente conhecidas. Um deles, por exemplo, afirma que Jesus era um homem rico e que o titulo "Cristo" era uma palavra usada na região para homens com riquezas materiais.
    No novo testamento existe o evangelho de 4 apóstolos, todos os textos que relatam os pontos de vistas dos outros 8 apóstolos (ou 9 contando com os textos escritos por Maria Madalena) não foram incorporados ao novo testamento devido aos diferentes pontos de vista e informações.
    Dentre os textos excluidos do novo testamento estão: Os Textos de Tiago, o livro de Tomé, o Evangelho de Judas Iscariotes, o Evangelho de Maria Madalena, o evangelho de Filipe entre muitos outros.
    Todos estas são escrituras que comprovadamente relatam a história de jesus e dos apóstolos sobre a otica de um dos apóstlos (apesar de terem sido escritos após as mortes dos mesmos, assim como os que estão no novo testamento).

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  3. Bom, meu intuito ao postar esse texto não foi de mostrar que a Bíblia está errada em relação ao que Jesus disse. Já é comprovado por grandes historiadores (cristãos e não cristãos) que dos textos disponíveis nos evangelhos podemos ter certeza de que em torno de 99,9% das palavras ali escritas foram realmente ditas por Jesus, esse assunto hoje em dia já não tem muitas discussões no meio acadêmico uma vez que já foi provado, além disso existe ainda hoje manuscritos que datam do primeiro e segundo século d.c.

    O que tolstoi questiona em seu livro é que a mensagem simples e clara que Jesus ensinava está em total discordância com o que achamos que ela é... que livres-pensadores, a Igreja e os fiéis praticam uma doutrina totalmente estranha ao que Jesus ensinava, ou seja, que nos afastamos completamente das palavras de Jesus por ter interpretado muito mal, seja por interesses de alguns que tem interesse em propagar o erro ou de nossa ignorância mesmo.

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  4. Ainda bem que você comenta Runaway, senão isso aqui seria muito monótono hehe.

    Cara eu acho que as tuas fontes sobre a questão da veracidade histórica dos livros do novo testamento, especificamente dos quatro evangelhos, estão equivocadas.

    Existem muitos livros bons que falam sobre o assunto, principalmente em inglês infelizmente, se tiver interesse em estudar o assunto aconselho o livro com tradução em português inclusive chamado:

    Questões cruciais do Novo Testamento, escrito por Craig L. Blomberg.

    No site

    http://www.apologia.com.br/?cat=1

    e também no site

    http://www.arqueologiadabiblia.com/2009/05/o-novo-testamento-e-historicamente.html

    existem vários argumentos científicos para a confiabilidade na veracidade histórica do novo testamento.

    Tem esse vídeo também sobre o assunto: http://www.youtube.com/watch?v=16a2Db7zw3M

    Sobre os testamento apócrifos eu já falei aqui no blog sobre eles... eles não são aceitos porque "abalariam as estruturas do cristianismo", isso ai é papo furado. Quem tiver interesse pode ler os testamentos apócrifos e ver que não tem nada de mais, além é claro de Jesus ainda bebê pregando para uma multidão de pessoas! Coisas absurdas desse tipo... logo os apócrifos não são aceitos pela maioria dos historiadores sérios pois não existe nenhum evidência que comprove sua veracidade, já que os primeiros como o de São Tomé foi escrito entre 300 a 400 anos depois da morte de Jesus, 3 ou 4 gerações depois... diferentemente dos evangelhos que foram escritos ainda no primeiro século, possibilitando a testemunhas oculares do fatos da vida de Jesus escreverem esses livros.

    Pra quem quer negar a si mesmo, tomar sua cruz e assim encontrar a Verdadeira vida, não precisa se preocupar com isso... o que o Mestre ensinou a 2000 mil anos atrás ainda está disponível para quem quiser aprender e seguir. Veja o Sermão da Montanha, todo o padrão de moral elevadíssimo que Jesus pregou está ali. Logo o problema não está em aquelas palavras serem verdadeiras ou não (quem nos dera!!), mas sim em quem quer dar o primeiro passo, negar a si mesmo, tomar sua cruz e segui-Lo.

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  5. Kkkkkkkkkkk. Aprendi muito

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